QUANDO A CONFIANÇA ACABA, MAS O COMISSIONADO CONTINUA

Sabemos que a Constituição Federal admite o ingresso de servidores sem concurso público para a ocupação de cargos em comissão para o exercício de apenas três funções: direção, chefia e assessoramento.

Hoje falaremos um pouco sobre a função de assessoramento, a justificar o cargo em comissão.

O assessor cargo em comissão difere-se do assessor cargo efetivo apenas em razão do especial vínculo de confiança entre o servidor e a autoridade que o nomeou, já que a Constituição Federal autoriza sua livre nomeação e exoneração. Essa liberdade da autoridade advém, necessariamente, do vínculo de confiança com o nomeado.

Aqui é bom diferenciarmos a confiança pessoal da confiança técnica, profissional e ética.

Confiança Pessoal e Confiança Profissional e Ética
A confiança pessoal é aquela advinda de uma relação pessoal entre pessoas. Via de regra, de uma relação de amizade ou parentesco. A confiança técnica, profissional e ética, advém do reconhecimento destas capacidades na outra pessoa e a confiança de que ela continuará se guiando por tais capacidades. Assim, um juiz pode confiar plenamente no trabalho executado por um assessor, já que conhece a sua redação, seu conhecimento jurídico, seu cuidado na pesquisa jurídica, sua inteligência, suas escolhas éticas e ainda assim, não ter com ele nenhuma relação de amizade ou apreço pessoal. Ao contrário, pode até haver um maior afastamento pessoal dele do que com outros servidores. Ou seja, a confiança profissional independe da confiança pessoal.

Nesta linha, um assessor comissionado só justifica sua existência se a relação de confiança pessoal com a autoridade for imprescindível para a execução de seu trabalho, pois se bastar a confiança profissional e ética, a nomeação de um servidor efetivo é a orientação da Constituição Federal (art. 37, V).

Na verdade, é bastante difícil imaginarmos uma situação em que a confiança pessoal entre a autoridade e o assessor seja essencial à própria função, já que assessorar um magistrado, um prefeito, um parlamentar, no exercício de suas funções públicas, não se exige mais do que confiança profissional e ética, devendo, portanto, se dar por um servidor efetivo. Assim, uma hipótese de imprescindibilidade de cargo em comissão para a função de assessoramento que conseguimos imaginar é a de entidades pequenas (geralmente municípios de pequeno porte) em que não haja servidor efetivo com habilidades profissionais e éticas suficientes para se estabelecer a respectiva confiança na autoridade. É o caso, por exemplo, de o Poder Judiciário não disponibilizar assessor jurídico efetivo para o magistrado de pequena comarca, situação em que o magistrado poderia nomear assessor comissionado de sua confiança, caso a lei assim o permitisse, temporariamente, até que o Judiciário responsável preencha a lacuna, conforme o comando constitucional.

Atividades Técnicas
É de se lembrar ainda, que o entendimento firmado há muito pelo Supremo Tribunal Federal é o de que as atividades dos cargos em comissão não podem ser burocráticas, técnicas e operacionais.

Assim, a função de assessoria jurídica a uma autoridade é técnica, pois visa dar à autoridade a conformidade jurídica de suas atividades e iniciativas, conforme suas orientações e seu pensar.

Sendo atividade técnica, não caberia seu exercício como cargo em comissão.

O Término da Confiança Pessoal
Sem adentrarmos no tema do nepotismo, uma razão bastante evidente do encerramento da confiança que justifica a nomeação de assessor comissionado é o afastamento da autoridade que o nomeou.

Se um magistrado que nomeou um assessor comissionado se aposenta, parece evidente que o vínculo de confiança que justificou tal nomeação se encerrou, não havendo mais razão de existir tal cargo. Afinal, à luz da Constituição Federal, e do entendimento afirmado e reafirmado de nossa jurisprudência pátria, a confiança é requisito inafastável da existência do assessor comissionado.

Da Continuidade da Nomeação após a Extinção da Confiança
Não é raro se ver, contudo, a continuidade do exercício das funções do servidor comissionado mesmo após a extinção do vínculo com o serviço público, da autoridade que o nomeou.

Tal situação acontece aos borbotões no serviço público, notadamente no Poder Judiciário e Ministério Público, quando o juiz, desembargador, promotor se aposenta e o seu substituto mantém assessores nomeados pelo aposentado ou até pelo antecessor do aposentado.

Situações como essa apenas reforçam a realidade constitucional de que esses assessores deveriam ser efetivos, pois sua permanência no serviço público mesmo após o encerramento do vínculo de confiança descaracteriza-o como cargo em comissão.

Se você considera outra situação não aventada aqui em que o assessor comissionado é imprescindível ao serviço público, deixe aqui seu comentário e vamos alimentar esse importante debate.

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