MAIS MÉDICOS. FIM DA SAÚDE PÚBLICA?
Recentemente Jair Bolsonaro anunciou, como futuro Presidente do Brasil, as suas intenções de alteração do convênio entre Brasil e Cuba relativo ao programa Mais Médicos.
Três foram as alterações:
1. Os médicos cubanos devem submeter-se ao Revalida, prova a que todos – brasileiros e estrangeiros – devem prestar, para ter reconhecido seu diploma obtido em outras terras, e poder atuar no Brasil;
2. Os salários dos médicos devem pertencer aos médicos e;
3. Os médicos cubanos devem poder ter contato físico com seus familiares, incluindo a visitação no Brasil.
Cuba não aceitou e indicou o rompimento do acordo, determinando que os cubanos retornem a Cuba.
No Brasil, vozes se insurgem contra o anúncio, sob o argumento que agora, os rincões do país deixarão de ter atendimento médico.
Entenda o Programa Mais Médicos
Recentemente tive oportunidade de conversar longamente com um jovem cubano que mora clandestinamente em Miami. Advogado, sua mais forte recordação quando chegou aos Estados Unidos foi a de ter podido comer três maçãs, uma atrás da outra. Logo depois de ter se fartado com a lauta refeição, chorou. Seus pais ainda estavam em Cuba e a fome deles pesava em seu estômago cheio das três maçãs. Disse ele: se você não tem liberdade, você não tem nada.
Perguntei do afamado Mais Médicos. Depois da queda da cortina de ferro e da desintegração do comunismo soviético, Cuba perdeu a mesada da URSS. Sem recursos, começou a produzir “médicos” e esse produto se transformou no PIB de Cuba. Sem o aluguel de gente, Cuba também apodreceria.
Funciona basicamente assim: o governo cubano produz médicos e firma contratos com nações amigas. Tais nações pagam a Cuba o aluguel desses médicos. Entram divisas em Cuba (cerca de 11 dos 14 bilhões de dólares anuais que entram na ilha), sustentando o regime dos Castro.
As nações companheiras compram e depois vendem a ideia de que: 1. O programa é indispensável para o atendimento das populações não alcançadas pelo sistema de saúde; 2. A medicina cubana é uma das melhores do mundo; 3. Os médicos brasileiros não se dispõem a atender aquelas populações.
Mas e a formação desses médicos, questiono? Se a medicina de Cuba é das melhores do mundo por que não se submetem ao Revalida? Diz meu recém amigo que se a medicina de Cuba é das melhores não é o que se vê em Cuba. Os Castros não se tratam em Cuba, nem em seus Albert Einstens ou Sírios Libaneses. Os médicos não têm recursos para aprender adequadamente, porque Cuba não tem recursos. O recurso mais rico nas duas faculdades de medicina do país são vídeos. Sim, os “médicos” ali se formam por vídeos. É por filminhos que aprendem noções de saúde. Laboratórios, aulas práticas, residência, esqueça. Conhecem alguns medicamentos caseiros locais e procedimentos elementares. Conheço um médico que, em contato com colegas cubanos, acabou por concluir que o nível de conhecimento dos cubanos alugados equivale ao de Auxiliar de Enfermagem, na melhor das hipóteses. Por isso não se submetem ao Revalida.
A entrada de profissionais estrangeiros – seja lá a qualificação real que têm – para atender populações brasileiras mais vulneráveis, no entanto, causa espécie, na medida em que a saúde é, conforme a Constituição Federal, um direito social e obrigação do Estado. Constitui, portanto, um dos carros-chefes do serviço público.
Serviço Público de Saúde e o Mais Médicos
Os órgãos de controle externo são uníssonos em afirmar que o serviço de saúde, como obrigação da Administração Pública que é, obriga os municípios a terem em seus quadros permanentes, profissionais da saúde.
Há inúmeras decisões dos Tribunais de Contas espalhados pelo Brasil no sentido de considerar ilegais admissões de médicos sem concurso público, permitindo-se a contratação de médicos terceirizados apenas em situações de urgência e emergência, não alcançadas pelas características naturais da prestação desse serviço.
À época da implantação do programa Mais Médicos, durante o governo Dilma em 2013, com a locação de mão de obra cubana, a justificativa noticiada foi a de que os médicos brasileiros não se dispunham a prestar seus serviços às populações mais remotas, como comunidades indígenas, quilombolas, e outras enfiadas em nossos confins.
Veja que a justificativa parece não resistir, considerando que aproximados oito mil médicos se candidataram no programa para ocupar 983 vagas, na última seleção. Falta de interesse e vontade parece que não há. Também é preciso lembrar que o programa aliviou as contas municipais já que o governo federal passou a arcar com a despesa de médicos, o que provocou a demissão de médicos brasileiros para permitir a contratação dos cubanos.
Neste quadro, a suspeita qualificação dos profissionais cubanos, a injustificada dispensa de validação de tal qualificação dentro da ordem jurídica brasileira, a celebração de contrato/convênio internacional para importação de mão-de-obra, a demissão de profissionais brasileiros para alocação dos estrangeiros, acrescido do viés claramente político que pautou a opção governamental em 2013, põe em cheque o programa Mais Médicos como a melhor solução para a prestação do serviço de saúde pública, nos moldes como foi feito com Cuba.
De outro lado, as medidas noticiadas pelo próximo Presidente, parece fortalecer as normas brasileiras, restabelecendo a normalidade que se espera na vinda de profissionais estrangeiros, que, diga-se, são e sempre foram muito bem-vindos.
O mesmo não se pode dizer do governo cubano. Ora, se os cubanos vieram salvar o povo sofrido e esquecido pelo Estado Brasileiro e pelos médicos brasileiros burgueses, o abandono abrupto desses mesmos esquecidos, destrói o discurso que justificou o pouso dos famintos cubanos em nossas paragens há cinco anos.
Nota:
A exportação de profissionais da saúde por Cuba responde por 11 bilhões de dólares dos 14 bilhões de arrecadação anual com exportação de bens e serviços. https://www.bbc.com/portuguese/brasil-46247632. Acesso em 19/11/18 às 17h16.
Excelente abordagem. Sólidos argumentos. Parabéns pelo artigo, Doutoras Marilia
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